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segunda-feira, 28 de maio de 2012

RELIGIÃO - SEITAS PREGAM O AMOR E PRATICAM O ÓDIO

Jornal A Tarde,domingo, 24 de dezembro de 1978.
Fotos Arestides Batista
Texto Reynivaldo Brito

A propagação do fanatismo que culminou recentemente com o suicídio coletivo de quase mil pessoas em Guiana reflete o vazio que dominou a sociedade ocidental.
Homens e mulheres incapazes de resolverem seus problemas individuais apelam para um além em busca de uma válvula de escape. Uma prova maior desta afirmação é a facilidade que falsos líderes e fanáticos estão encontrando em todo o mundo para fundar seitas e outras manifestações religiosas, arrastando em pouco tempo milhares de seguidores.
Hoje se um indivíduo quiser prosperar rapidamente é só inventar uma nova religião que centenas de adeptos aparecerão.(Foto)
Sob a tutela de direitos constitucionais, que permitem a liberdade de culto, esses fanáticos gozam de privilégios nessas comunidades e cometem uma série de abusos. No Brasil algumas delas já chegam a assustar os policiais, os governantes e todas aquelas pessoas de bom senso que não acreditam em falsos profetas e líderes. Poderia aqui citar um rosário de seitas a exemplo de Hare Krishna, Meninos de Deus, Seicho No Ie, Prece Poderosa ou Igreja do Evangelho Quadrangular, Sun MYung Moon e a Cientologia, (do americano Ron Hubbara que trabalha com toda sua família e ostenta uma riqueza incompatível com o que prega em seus sermões). Perfect Liberty e assim chegaríamos aos Matotas e Marotas da vida que pululam os bairros periféricos e vales das grandes cidades. Na realidade é um punhado de falsos profetas a enganar incautos sob a proteção dos sistemas.

                                           INDIVIDUALISMO

Diria ainda que tudo que assistimos talvez seja fruto também do egoísmo e ao individualismo tão presentes na década de 70, onde o homem esqueceu o sorriso e a boa ação partindo para a agressão. As cidades cresceram, o trânsito engarrafou, a comida ficou cara, e o emprego difícil. Os assaltos se multiplicaram e a repressão policial não foi capaz de extingui-los porque o remédio existe, mas não pode ser usado.
Porém, o que mais assusta é que os homens depois de acabarem com as florestas, a fauna e matarem seus semelhantes agora partem para ameaçar centenas e vão mais além quando pregam a autodestruição em massa como protesto ou solução para um problema determinado. O raciocínio é deixado de lado e as paixões tomam por inteiro grupos, facilmente identificados por seus trajes, suas atitudes agressivas diante de um estranho e as reuniões e falácias que incomodam a todos. Isto pode ser comprovado quando um estranho chega a uma dessas seitas para assistir a uma reunião ou mesmo quando procura saber a fundamentação do que pregam.
Lembro-me que há poucos anos Nair Saback tinha sua casa apedrejada por estudantes e freqüentemente era visitada pela polícia. Hoje, está esquecida e contínua praticando seu espiritismo acusado de baixo por uns e enaltecido por outros. O fato de estar esquecida é porque as seitas se multiplicaram e parece que as pessoas encarregadas da segurança e bem-estar social perderam as rédeas. Todos correm a muitos quilômetros por hora em busca do nada. Assistimos a tudo atônitos por não entender tanta coisa dita em nome de um Deus, por pessoas que pregam o amor e praticam o mal.

                                                PRÓDIGA

A Bahia é pródiga em seitas e outras manifestações religiosas que aparecem nos bairros periféricos de Salvador e também no interior do estado. Em muitos de seus terreiros e templos vítimas foram assassinadas em nome de Deus e até do diabo. Essas seitas são freqüentadas em sua grande maioria por pessoas desprovidas de educação e de baixo poder aquisitivo, razão pela qual muitas vezes são arrastadas por falsos líderes e profetas. O exemplo maior deste fato foi o assassinato de oito crianças por uma misteriosa e até desconhecida seita religiosa “Universal Assembléia dos Santos”, que tinha como idealizador o “profeta” José Maurino Carvalho, de 29 anos, o “Matota” e sua mulher “Marota” que hoje se encontram no Manicômio Judiciário, onde estão sendo periciados por uma equipe de médicos e psicólogos. Porém, antes dele um outro “profeta” assassinou algumas pessoas no município de Rui Barbosa e até hoje o caso arrasta-se na Justiça, já que os advogados do criminoso apelaram para o Supremo Tribunal.
A seita Universal Assembléia dos Santos, em pouco tempo conseguiu atrair dezenas de pessoas, que moravam na zona rural do município de Mundo Novo e de lá vieram para assassinar as crianças por afogamento numa praia localizada, nas proximidades do Aeroporto Dois de Julho em Salvador, num ritual macabro em que os pais e mães das vítimas iam entregando uma a uma ao falso profeta que, as atirava do mar revolto e quando conseguiam subir à flor da água eram novamente obrigadas a permanecer debaixo d’água até a morte. O crime abalou a opinião pública em todo o país e aquele punhado de trabalhadores rurais (eram 21) não sabiam ao menos dar maiores fundamentações sobre a seita e porque havia entregues seus filhos ao sacrifício.Outro, ficaram revoltados e passaram a acusar o ex-líder da seita.

                                                  MENORES

Dos 21 implicados e integrantes da seita Universal Assembléia dos Santos, três eram menores e foram transferidos para o Juizado de Menores enquanto os demais depois de interrogados foram encaminhados ao Manicômio Judiciário onde seus casos estão sendo estudados individualmente por especialistas.
Os seguidores eram empregados de uma fazenda em Mundo Novo, inclusive um era o capataz, e em março de 1977 resolveram vender todos os seus pertences alegando que queriam cumprir a palavra de Deus e vieram para Salvador com o objetivo de aqui instalar a nova seita. A caminhada foi longa, pois Mundo Novo dista mais de 300 quilômetros de capital e ao chegarem acamparam perto da praia de Stela Maris, quando ouviram as pregações do “profeta” José Maurino de Carvalho que num ritual ainda não muito esclarecido ele recebeu o “chamamento” de Deus dizendo que as crianças eram pecadoras e deviam morrer. “Elas não eram de Deus e deviam ser mortas”. Já os adultos que caíssem em pecado “teriam retirados de si o Espírito Santo e ficariam loucos”.
Todos os membros da seita, inclusive as crianças, tiveram seus nomes trocados por outros considerados estranhos como o do profeta e sua mulher “Matota”, e Pedro Bispo dos Santos, que foi batizado como “Fana El”, e assim por diante.

                                   ONDE APRENDEU

O trabalhador rural José Maurino de Carvalho veio para Salvador em busca de emprego.
Lá trabalhou de servente e funcionário de uma loja na Baixa de Sapateiros. Foi na capital baiana que ele freqüentou a chamada Igreja Messiânica, que tinha como pastor um tal de Miguel recebeu algum ensinamentos, que lhe foram necessários para fundar a sua própria seita e sacrificar inocentes.
Essas manifestações de fanatismo incompatíveis com o grau de civilização que alcançamos, e que excluem de nosso meio os profetas e taumaturgos, que vez por outra aparecem, animados de propósito inconfessáveis representam uma regressão cultural. Porém, mais cedo ou mais tarde eles perdem a liderança ou são desmascarados como aconteceu com o José Maurino de Carvalho que depois de viver 28 anos na pobreza acabaram perdendo nas ondas do mar de Salvador tudo que imaginava possuir: os seus seguidores, sua liberdade sua liderança de profeta e talvez até sua fé em Deus. Não podemos afirmar com segurança que perdeu a fé porque o profeta está custodiado no Manicômio Judiciário e não pode ser entrevistado.

                                             MISTICISMO

Muitos acreditam que Maurino seja um esquizofrênico, com alucinações visuais e auditivas e periculosidade latente. Assim pensa o professor de Medicina Legal, Estácio de Lima, autor de um livro sobre o fanatismo nordestino. Para ele as pessoas que vivem numa miséria muito grande e ainda por cima são ignorantes tendem a se agarrar a qualquer coisa que acene uma possibilidade de melhora, mesmo que essa melhora só venha a ocorrer depois da morte. Ele recordou o carisma de Antônio Conselheiro, que conseguiu arregimentar milhares de seguidores e ainda o episódio de Pedra Bonita, em Pernambuco, ocorrido há cerca de 200 anos, quando um líder religioso convenceu seus seguidores de que só melhorariam de vida depois que a Pedra Bonita - Uma enorme rocha de granito fosse coberta pelo sangue de crianças. Assim dezenas delas foram degoladas e seu sangue derramado sobre a rocha.

                                      MIGALHAS DE ROMA

Originária de Los Angeles, na Califórnia as Santas Missões ou Igreja do Evangelho Quadrangular ou Prece Poderosa está se expandindo com muita desenvoltura em todo o país.Basta dizer que já conta com “seminários” em São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte, Curitiba e Belém do Pará. Na Bahia já existem templos nas principais cidades do interior do estado e em Salvador existem três grandes missões já implantadas e uma menor em fase de implantação. Seus seguidores são pessoas humildes, dos bairros periféricos que participam de cultos onde levantam os braços e gritam e cantam em nome de um Deus que teimam em acreditar.
- Estamos comendo das migalhas de Roma, bradou ao repórter o missionário Aparecido de Souza, que está em Salvador, em visita a seus colegas da Prece Poderosa, o qual revelou que já foram toxicômano e cantor de inferninhos em São Paulo, onde nasceu, e foi num templo desses que encontrou “o caminho do Senhor”.
Na foto os braços para o alto na esperança de uma providência para o sofrimento em que vivem.
A Igreja do Evangelho Quadrangular, Santas Missões ou como é mais conhecida Prece Poderosa atende em Salvador mais de cinco mil pessoas por dia em barracões improvisados de templos. Ali as pessoas ficam sentadas sobre pedaços de panos velhos, toalhas e até travesseiros e outras de pé cantando músicas populares e religiosas. O culto é divertido.
Quando o fotógrafo entrou para fotografar o missionário bradou para seus seguidores:
O fotógrafo não é simpático? ÉÉÉÉ bradou a multidão de fiéis e assim o Aristides Batista pôde realizar o seu trabalho com certa tranqüilidade.
Acompanhamos todo o trabalho, inclusive a campanha que eles estão desenvolvendo para compra de um terreno que custa mais de Cr$ 2 milhões de cruzeiros. Durante o culto foi distribuído um envelope e o missionário indagava a todo momento se todos haviam recebido. Se já receberam levantem os braços, gritou novamente e assim centenas de envelopes foram mostrados ao missionário que deu uma larga gargalhada, talvez, satisfeito com a arrecadação do dia. A descontração é portanto, uma presença na Prece Poderosa.
Seus missionários vestem-se de preto com uma bata que só colocam na hora do culto. São casados e vive uma vida normal no seu dia-a-dia. “Tem carros próprios e outros equipamentos tão desejados, pela classe média e argumentam que o conforto é uma conseqüência porque “digno” é o obreiro do seu salário”.
Não tivemos oportunidades de conversar com nenhuma das pessoas que os missionários dizem estar curadas através da fé. Esta cura - como explica o missionário Venceslau Gomes Gonçalves, do Mato Grosso de Sul, que dirige uma das Santas Missões em Salvador, é feita através da força de Deus e nós somos apenas intermediários.
Quando falamos que explicação ele dá para os envelopes, Venceslau afirma categoricamente que todos os ofertórios são dados voluntariamente, não temos atendimentos ou consultas particulares.

                              NEM TUDO É TRANQUILIDADE

Desafiando a proibição que existia de realizações públicas centenas de seguidores da Prece Poderosa saíram às ruas de Salvador em 2 de setembro de 1976, tendo à frente o pastor Francisco Epifânio Rocha de Almeida porque a polícia havia proibido o culto que se realizava diariamente nas proximidades de ex-feira de Água de Meninos. Quando os policiais resolveram deter o pastor para interrogatório os seguidores em verdadeira procissão gritavam, choravam e oravam em altas vozes exigindo a sua libertação. Eles percorreram as ruas principais e em seguida rumaram para a Secretaria de Segurança Pública até a soltura do pastor. Fizeram uma concentração que foi dispersa pela polícia com bombas de gás lacrimogênio e policiais armados de metralhadoras.
Na época o cardeal D. Avelar Brandão Vilela, Primaz do Brasil, fez uma advertência quanto ao aparecimento desses falsos profetas e líderes. No mesmo dia o missionário da Prece Poderosa respondia que “muitos nos perguntam quando vamos sair daqui e eu respondo que nós viemos para ficar”.
O crescimento acelerado do número de seguidores, verdadeiros fanáticos, capazes de agredir um visitante de um templo da Prece Poderosa - é explicado pelo missionário Venceslau Gomes Gonçalves: recebemos ajuda vinda dos Estados Unidos, especialmente de Los Angeles, na Califórnia, onde se encontra o líder maior que é o reverendo Dr.George Tussel Falckner. Na Bahia o líder é Francisco Epifânio Rocha de Almeida, um carismático que assume posições messiânicas com seu traje preto de cetim lustroso e que consegue colocar milhares de pessoas sobre o domínio de suas palavras e seus gestos. Essas e outras manifestações religiosas proliferam, sem que as autoridades atentem para o perigo que representam.

















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