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quinta-feira, 28 de julho de 2011

ARTES VISUAIS- QUANDO O ORIXÁ É ARTE E CULTO

ARTES VISUAIS



Jornal A TARDE 29 DE SETEMBRO DE 1971.
Texto Reynivaldo Brito

O escultor e tapeceiro Manuel Bonfim volta a fazer uma exposição de seus trabalhos, calcados em motivos afro-baianos no dia 10 a 15 de outubro na Galeria Canizares, da Escola de Belas Artes . São dezenove esculturas em baixo relêvo retratando os Orixás dos Candomblés e 10 tapetes sobre o mesmo tema.
A família de Manuel Bonfim trabalha unida. O seu filho de 13 anos ajuda o artista a entalhar os esboços. A sua esposa ,sobrinhas e primas costuram os tapetes que ele desenha e determina as cores. Tudo é feito seguindo a temática do afro-baiano que caracteriza seu trabalho já consagrado pela crítica de todo o país. Mas, o Manuel Bonfim é um homem pobre.
Embora os seus trabalhos estejam ornando mansões de embaixadores,políticos, industriais e intelectuais ele ainda não conseguiu comprar a velha casa onde mora no alto do Rio Vermelho, alugada há vários anos.Mas, o artista é um abnegado e ri da pobreza.

                                       O HOMEM

Manuel Bonfim - é o seu nome de batismo - nasceu em Salvador na Maternidade Climério de Oliveira, em 25 de maio de 1928. Até os 14 anos viveu na cidade de Nazaré das Farinhas da qual guarda alegres recordações.Mas, antes de ser escultor, frequentou, como todo garoto pobre algumas oficinas de trabalho.
Foi barbeiro,funileiro,alfaiate,ajudante de pedreiro, pedreiro e até operador de cinema em Itapagipe. Esteve no Exército de 1948 a 1949.
Foi o professor Mendonça Filho ( já falecido) na Escola de belas Artes da Bahia quem arranjou um emprego de servente e depois ajudante na EBA . Logo depois Manuel ficou como atendente na sala de Modelagem e lá aprendeu a modelar o barro. Porém, sua vocação de artista já afluia desde a sua infância quando ajudava a sua mãe a armar o Presépio de Natal , todos os anos. Com miolo de pão Manuel Bonfim fazia, entre outros, vaquinhas, carneiros, burricos, que eram pintados e serviam de admiração dos nazarenos.

                                       O ARTISTA

Logo que conheceu a modelagem , na Escola de Belas Artes, Manuel Bonfim passou a fazer uma série de trabalhos copiando a Vênus de Milo e algumas esculturas de Rodin, que considera o maior artista de todos os tempos "superando até Leonardo da Vinci".
Ainda hoje, trabalha na Escola de Belas Artes onde é assistente do professor Udo Quoff na cadeira de Cerâmica . É escultor nível 12, da Universidade Federal da Bahia, cargo conseguido através de concurso. Em 1950 serviu na cadeira de escultura em madeira quando o escultor Mário Cravo foi convidado para lecionar na Escola de Belas Artes. Assistia as aulas de Mário Cravo com vivo interesse. Ali aprendeu mais um ofício, escultor em madeira, e de lá para cá, é, praticamente, a única coisa que tem feito no terreno da arte plástica.

                                        OS ORIXÁS

Foi no livro de Carybé "As sete portas da Bahia" da Livraria e Editora Martins que ele entrou em contato com os Orixás.Já fazia temática afro-baiano:máscaras e outras esculturas africanas. Foi o primeiro artista a retratar na madeira os Orixás dos candomblés baianos.Carybé os desenhou em seu livro e Manuel os esculpiu em pedaços de madeira.
Depois,o próprio Carybé esculpiu alguns dos Orixás para um grande painel móvel de um banco baiano. Estes Orixás estiveram recentemente expostos na Guanabara e agora estão no Rio Grande do Sul.
Diz Manuel Bonfim que gosta de fazer os Orixás porque são autênticos e estão ligados à tradição da Bahia". Estes trabalhos são muito aceitose procurados por turistas que nos visitam.Os Orixás Iemanjá - Rainha do mar - Iansã que é Santa Bárbara e Oxalá , Senhor do Bonfim, são as tr6es peças preferidas.
                                            TAPETES

Atualmente Manuel Bonfim está produzindo tapetes calcados na temática afro-baiana. Foi sua esposa d. Maria Augusta, que o incentivou a entrar na tapeçaria. Ele desenha os tapetes, determina as cores e a sua família encarrega-se de confeciona-los. A princípio ficou com receio de ser acusado de copiador ou coisa semelhante, "tão comum entre os medícocres". Dai ele procurou um ponto original e conseguiu. Utiliza o "ponto esteira africana", que é uma espécie de bordado de origem africana.
"Este ponto é muito trançado, diferente do ponto arraiolo e do ponto espinha de peixe", explica.
Embora o ponto "esteira africana"tenha alguma semelhança com estes dois outros, não é o mesmo. Gastando muita lã e sendo dispendioso, não permitindo um bom lucro, com a venda, Manuel Bonfim está feliz porque os seus tapetes tem originalidade.

EXPOSIÇÕES

Manuel Bonfim fez uma primeira exposição em 1963 na Galeria Bazart , depois na Galeria Querino com o atual tapeceiro Renot, e em seguida , foi convidado para expor na Galeria Goeldi, no Rio de Janeiro. De lá para cá não mais parou. Já fez cerca de 10 exposições individuais e várias coletivas. Participou também de várias exposições de caridade e outras promoções de caráter beneficentes.
Para ele o artista não deve casar. Manuel Bonfim acha que o artista quando casa tem muita responsabilidade nas costas e fica muito preocupado com a família.Isto de certa forma prejudica a arte. Além do mais sou um cara muito preocupado porque além da reponsabilidade com o sustento de meus três filhos e de minha esposa ainda tive que arranjar um trabalho. Embora seja bem casado e goste muito de minha família, reafirmo que o artista não deveria casar".

Atualmente Manuel Bonfim restaura algumas molduras de quadros da Câmara de Vereadores de Salvador , enquanto o professor Rescala recupera as telas.
Trabalhou também durante 9 anos com D. Clemente da Silva, vigia no Museu de Arte Sacra e muitas das peças que estão lá expostas foram por ele restauradas.
Manuel é um artista realizado pelos trabalhos que faz. Mas, ainda falta muito para realizar-se totalmente, e isto só conseguirá quando comprar a casinha que mora e quando puder dar mais um pouco de conforto a seus familiares.

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