Objetivo


quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

EDUCAÇÃO - A HORA DE ESTUDAR ATRAVÉS DA ARTE

A TARDE – SEXTA-FEIRA, 12 DE AGOSTO DE 1977
Texto: Reynivaldo Brito Fotos: Gildo Lima
“O homem só pode atingir a harmonia do seu ser, portanto a sua felicidade, se não descurarde nenhuma de suas potencialidades.
O predomínio, na escola, do racional, do pensamento abstrato, tende a suprimir o lado afetivo, emocional e instintivo da pessoa humana. E toda a moderna psicanálise está a demostrar a enorme importância do fator afetivo na estruturação de personalidades equilibradas".
                             ONOFRE PENTEADO NETO
A habilidade manual para uma melhor integração -foto

Estamos  assistindo aos poucos uma preocupação dos educadores do país em possibilitar à criança o desenvolvimento de suas potencialidades através de métodos modernos que podem ser resumidos no respeito ao ser humano e à sua capacidade de criação.
Este movimento teve início no Brasil há exatamente 29 anos quando foi criada a Escolinha de Arte do Brasil que proporcionou em julho de 1972 o encontro do Movimento de escolinha de arte – qualquer centro ou instituição que comunga o desenvolvimento o das potencialidades de criação – em busca da liberdade.
Desse encontro surgiram algumas conclusões que vêm sendo postas em prática em quase todos os Estados brasileiros e até em alguns países sul-americanos. Foi criada a Associação Brasileira DE Educação através da Arte, órgão filiado à INSEA-UNESCO, Internacional Society for Education Throug Art, com a finalidade de estimular e valorizar as experiências realizadas pelas escolinhas e grupos de arte, por instituição e pessoas com interesses afins. Cabe ainda a esta associação criar áreas culturais e educacionais visando ampliar a ação deste movimento.
                                                              CONCLUSÕES

Eis aqui algumas das conclusões a que chegaram os organizadores do encontro que são de grande importância. Vajamos: necessidade das escolinhas de arte do Brasil em se constituir num centro revitalizante e gerador das suas idéias de educação através da arte, sendo veiculo dessas idéias os professores que se identifiquem neste processo; necessidade de encontros daquele tipo para se manter a unidade do movimento; necessidade de renovação pela análise e critica constante de experiência que sejam vistas como sínteses criadoras temporárias e suscetíveis de mudança no campo arte-educação; e necessidade da penetração das escolinhas no interior estimulando Centros de Cultura, capazes de favorecer o próprio crescimento da escola e do meio ambiente.
Foram mais ou menos estas conclusões que levaram centenas de pessoas a se preocuparem com o movimento Educação pela arte. Exatamente por crença em todo este ideal que é a Educação através da Arte que um grupo de professores sob a orientação da Secretária de Educação do Município, professores Maria Stela Pita Leite, realizará em Salvador o I Encontro Municipal de Arte e Educação reunindo especialistas de vários Estados brasileiros. Eles debaterão entre os dias 22 e 27 do corrente mês no Retiro de são Francisco as suas experiências com vistas à criação do Núcleo Municipal de Arte e Educação que será a pedra de toque para a adoção de uma política mais abrangente no setor, envolvendo não apenas especialistas, mas também todo o professorado
que deve voltar suas vistas para o desenvolvimento das potencialidades criativas de seus alunos. Será um grande passo para minorar o problema citado pela escola tradicional e coercitiva, onde os valores são impostos de cima para baixo sem a preocupação com a recepção e os resultados desta imposição.
Este núcleo não deve ficar restrito ao pessoal da Secretaria Municipal de Educação e Cultura e muito menos aos participantes e organizadores deste I Encontro de Arte e Educação. Ele deve ser integrado à comunidade baiana para que os adultos e as crianças busquem e encontrem os caminhos que permitam um maior dinamismo deste ideal. O Núcleo pensa na criação, no jovem, no adulto e funcionará no Parque da Cidade, um local privilegiado que se transformará num laboratório natural motivador, na perspectiva de promover o desenvolvimento do ser humano. Na foto acima a criação livre representa arealização da criança.
                                                                             
                                                                              O MOVIMENTO

Explica o professor Onofre Penteado que o conceito de “Educação pela Arte é um movimento cultural que congrega educadores, artistas e professores, secundados por psicólogas, filósofos, sociólogos e críticos de arte tendo por meta integrar o processo criador nas escolas de todos os níveis e tomando como ponto de partida programática a valorização da arte no processo educacional”.
Este movimento nasceu no século XIX quando foram iniciados os trabalhos da psicologia da aprendizagem e a constatação das diferenças individuais do conhecimento das necessidades humanas em termos de estímulos, incentivos e motivações.
Cresceu por sua importância para o desenvolvimento da criança e assim várias disciplinas artísticas foram sendo incorporadas aos currículos escolares em todo o mundo. Os teóricos cuidaram de fundamentá-lo. Os técnicos educacionais em torná-lo realidade, e, hoje, assistindo o crescimento desta escola nova que permite uma maior abertura, flexibilidade, dinâmica e que “representa na sociedade atual em crise, a presença do espírito humanístico que sempre se manifestou ao longo da História”.
Segundo os seguidores do movimento Educação através da Arte são vários seus objetivos: busca a harmonia do homem, o sentimento e a razão, a poesia e a técnica. Procurando desperta a consciência dos valores comunitários, os sentimentos de nacionalidade e de universidade, fins psicológicos e sociais a que visam as praticas criadoras nas escolas. Essas atividades têm por meta a democracia e a paz universal, como diria Herbert Tead (1893-1968), um de seus teóricos.
Diante disto a personalidade do educando deve ser respeitado e repelido qualquer totalitarismo negador da pessoa humana. Isto porque acredita-se que na pessoa humana está a essência das diferenças individuais exigidas por qualquer sociedade aberta.
Os educadores integrados neste movimento aceitam consequentemente os diferentes modelos de expressão e incorporam o pensamento de Edouard Claparède (1873-1940), segundo o qual as sociedades, como os organismos, progridem por diferenciação, pelo processo da divisão do trabalho, e não pela redução de todos os elementos vitais a um tipo único”. Foge, portanto da massificação que a criança sofre diariamente em frente ao vídeo onde são lançados tipos estereotipados que traduzem apenas heróis falsos criados por uma sociedade de consumo. Os educadores estão preocupados em desenvolver o espírito do educando adaptando-o à vida social concebida à maneira democrática, valorizando as aptidões individuais convergindo-as para a felicidade comum.
Estamos assistindo em todo o mundo as manifestações coletivas, inclusive nas bienais e salões de arte contemporâneos. Um trabalho onde são respeitadas as opiniões, onde desaparecem as vedetes e surge o trabalho cooperativo e livre. A arte ganha importância e ocupa desde os primórdios lugar de destaque unto ás ciências como a Matemática e a Física. Não podemos pensar somente no imediatismo do profissional. É preciso cuidar do espírito do profissional e acima de tudo desenvolver suas potencialidades porque assim ele estará mais apto para sua integração social.

                                                               OS EXPOENTES

Diz Onofre Penteado que entre os expoentes do movimento Educação pela Arte podemos destacar Herbert Read, Viktor Lowenfeld, Arno Stern, Pierre Duquet e em nosso País o artista Augusto Rodrigues, fundador da Escolinha de Arte do Brasil, do Rio de Janeiro, que estará presente ao encontro promovido pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura. Muitos são os artistas que comungam esses pensamentos e muitos deles virão à Bahia para trocarem experiências com seus colegas baianos. Será um encontro de relevo para a educação do município e marcará época porque importantes conclusões serão reveladas e utilizadas no desenvolvimento do Núcleo a ser instalado no Parque da Cidade.
É preciso não esquecer que toda a psicologia moderna atenda para a atividade artística da criança como uma expressão que serve a todos os fins habituais da linguagem: abstração, sonho, comunicação com outros.
Nós comunicadores engajados no processo tecnicista da sociedade contemporânea damos uma supervaloração à linguagem verbal e à expressão por meio de símbolos matemáticos, por serem como diz ainda Onofre Penteado – “mais adequados às abstrações, ao pensamento lógico”. Mas é preciso perguntar se este comportamento é apropriado à natureza da criança como ser humano. Certamente que não, porque a linguagem da criança é do sentimento e é através dos rabiscos que fazem nas paredes, no papel e também nas formas desproporcionais que elas criam, que está seu melhor meio de expressão.
Diz Herbert Read que “uma das principais finalidades da educação deveria ser a de conservar nas crianças o dom que têm de nascença: a intensidade física da percepção e da sensação. “Mas, os métodos irreais aplicados nas escolas é mesmo no seio da família resultam no distanciamento deste dom”,

                                                                         NA BAHIA

Em Salvador, o l Encontro Municipal de Arte e Educação será realizado antes do organizado pela Sobreart, no Rio, e contará com a presença de: Augusto Rodrigues, pernambucano fundador da Escolinha de Arte do Brasil; diretor-técnico dessa instituição, fundador da escolinha de Arte de Recife, presidente de Honra da Sobreart, artista plástico, caricaturista e critico de arte. Nasceu em 1931. Noemia de Araújo Varela, Gaúcha, membro do Conselho Mundial da Insea, diretora do Departamento Pedagógico da Escolinha de Arte do Brasil, vice-presidente da Sobreart e mesmo do Comitê Nacional da OMEP. Zoé Noronha Chagas Freitas, carioca, presidente da Sobreart, vice-presidente da Escolinha de Arte do Brasil e organizadora do I Encontro Latino-Americano de Educação através da Arte. Cecília Fernandez Conde, carioca, diretora do Departamento de Cultura do Conservatório Brasileiro de Música, assessora do Departamento de Cultura da SEC, Rio de Janeiro e membro da diretoria da Sobreart; Ilo Krugli, argentino, assistente técnico do Departamento de Cultura da SEC, Rio, professor das atividades teatrais da Escolinha de Arte do Brasil, autor de peças e ganhador do “Moliére” com o espetáculo “Federico Garcia Lorca – Suas pequenas Histórias”; Lúcia Alencastro Valentim, carioca, técnica em assuntos educacionais do MEC, responsável pelo departamento de Educação Artística; Bartolomeu Campos Queiroz, assessor da Sec. Ed. de Minas, filósofo e especialista na área Arte-Educação; Iara Matos Rodrigues, gaúcha, diretora da Escolinha de Arte da UFRGS; e Cascia Frade, mineira, assistente do Dep. de Cultura da Secretaria de Educação do Rio, professor de Educação Musica e pesquisadora do Folclore, com tese defendida. São esses alguns dos convidados com presença assegurada sem falar em estudiosos baianos em várias áreas que também participarão do encontro promovido pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura.

                                                                 TAMBÉM NO RIO

De 18 a 22 de setembro próximo será realizado no Rio de Janeiro o I Encontro Latino-Americano de Educação através da Arte promovido pelo Ministério da Educação e Cultura, Funarte e Instituto Nacional de Artes Plásticas. Este encontro será executado pela Sociedade Brasileira de Educação através da Arte – SOBREART vinculada à INSEA, International Society for Education Through Arte e Escolinha de Arte do Brasil. Os estudos e debates girarão em torno do tema básico: Arte, Educação e Comunidade, através de conferências, painéis, grupos de estudos liderados por educadores e artistas latino-americanos. Será realizado na Universidade do Estado do Rio Janeiro.

CULTURA - UMA NOVA CAROLINA DE JESUS SURGE NOS ALAGADOS

A TARDE – SEXTA-FEIRA, 12 DE AGOSTO DE 1977
Texto Reynivaldo Brito
Fotos: Arlindo Félix e Lula Carvalho




Solange, condenada sem Júri sofre há mais de trinta anos.
As lembranças de um passado triste, incompreendido e marginalizado levaram Solange Ribeiro, uma moradora de Alagados – bairro de palafitas que abriga mais de 100 mil pessoas, - a escrever um livro intitulado “Condenada Sem Júri”, onde relata toda sua dor. Seus contos, poemas e pensamentos ecoam como gritos contra a marginalização a que vem sendo conduzida desde sua infância. Sua aparência é de uma mulher frágil, mas que tem uma grande facilidade de se comunicar com as pessoas e uma vontade ferrenha em vencer.
Assim 17 anos depois que surgiu “Quarto de Despejo”, de Carolina Maria de Jesus, a favelada paulista recentemente falecida, eis que outra moradora de uma área-problema resolve transportar para o papel os seus sofrimentos. O seu maior sonho é editar o livro na esperança que todos os problemas que enfrenta sejam solucionados. Com a editoração do livro, Solange Ribeiro espera educar seus setes filhos e “melhorar a situação de minha família”. Ela não sabe que Carolina Maria de Jesus, mesmo depois do sucesso do livro, levou uma vida humilde e de sacrifícios até sua morte.
O livro
– Estávamos exatamente no ano 1940 quando as enchentes ameaçavam transbordar aquele famoso Rio Paraguaçu. Numa cidadezinha do interior, por nome São Felix, nascia mais uma criança do sexo feminino que puseram o nome de Solange. A alegria ao nascer foi nenhuma. Nasci na Segunda Guerra Mundial e vim para uma guerra de conflitos sentimentos que hoje vivemos. Pois foi minha concepção, e fui envolvida numa rede de conflitos que viviam meus pais. Eles que não conheciam a palavra amor. Poderia ter nascido uma heroína, pois São Félix é irmã gêmea de Cachoeira, a Cidade Heróica, que resistiu contra o invasor estrangeiro, Mas, não foi nada disto. Não posso jamais imaginar o que se passava dentro de seus sentimentos. Nunca pensei que por ser filha adulterina o destino me odiasse a passos lentos. ”Naquele tempo não tinha maturidade para julgá-los”. Estas palavras estão contidas no capitulo principal e que dá o nome ao livro da favelada Solange Ribeiro. Ela continua fazendo um relato amargurado de sua infância. Fala de suas decepções e do comportamento sexual irregular de seu pai que tentara até possuí-la.
Estudou o primário em São Félix, uma cidadezinha que dista quase cem quilômetros de Salvador. Aos quatro anos de idade foi morar com a esposa de seu pai de nome Onélia Bastos Ribeiro, que ainda reside na Cidade de Cachoeira. Seu relacionamento com a madrasta continua até hoje e ela a chama de titia. Diz Solange que “titia é uma pessoa maravilhosa”. Mas, com vinte anos de idade Solange não aguentando mais as investidas de seu pai transfere-se para Salvador. Estávamos no ano de 1960 quando conheceu seu primeiro esposo com o qual teve dois filhos. Com cinco anos de casada seu marido suicidou-se, a exemplo de seu irmão de nome Frederico. Segundo ela, as mortes não tiveram qualquer ligação. “Foi pura coincidência. Meu marido tinha problemas de saúde e financeiros. Desde cedo que enfrentamos uma vida dura. Mas o pior foi o seu desaparecimento”.
Depois desde triste acontecimento, Solange continuou seu destino e teve mais dois filhos com um companheiro sobre o qual não gosta de falar, vive com um motorista de táxi, desempregado, chamado Nelson Santos, com o qual já tem dois filhos.
Os Poemas
Além do livro “Condenada sem Júri” Solange Ribeiro escreve poemas que trazem à tona os mesmos problemas relacionados em seus contos. Um deles intitulado: “Aos Heróis dos Alagados”, é este:
“Conheço grandes heróis, / Que são bem pouco lembrados / Sabem eles quem são? / Nossos queridos alagados. / Os anos vão passando / E nós naquela ilusão / Em ver nosso barraco em terra / Diante de nossa visão / As crianças estas coitadas / Não sentem seu grande drama / De crescer e ser gente um dia / Pelo asfalto do lixo / Brinquedos, remédios e comida / Não se fala é puro mito”.
Aí Solange demostra sua amargura em ver seus filhos brincando nas pontes que ligam uma palafita a outra. Constantemente crianças caem dessas pontes e espetam-se, quando não morrem afogados nas águas escurecidas e podres de Alagados.
Outros poemas de Solange fala de sua mãe que desapareceu quando tinha quatro anos de idade. Ela afirma que sua mãe mora no Rio de Janeiro, mas nunca teve notícias como está passando. Este ano escreveu um poema dedicado a sua mãe que diz: “A Mamãe” – “Quando lhe vi um dia / Tinha apenas quatro anos / Pensa que lhe esqueci? / Se pensa é puro engano! / Lembro da despedida / Foi um mês de novembro / Você chorava tanto / Vê como ainda me lembro! / Todos os dias eu fico / Esperando a sua volta / Creio que nesse dia mamãe / De saudades estarei morta!...”
Ela não resiste e apela para que sua mãe apareça pois “era bem importante que reencontrasse minha mãe. Papai já morreu e tenho apenas a minha “titia” que está com a saúde muito abalada”.
“Meu pai morava em Cachoeira e trabalhava como escriturário numa firma de exportação e dominava alguns idiomas. Falava com muita desenvoltura. É tudo que lembro, além das investidas, que muito me marcaram”, adiantou.
O Sonho
O maior sonho, no momento, de Solange Ribeiro é editar o seu livro. Foi com este objetivo que procurou o radialista França Teixeira, que tem um programa esportivo na Rádio Clube da Bahia. Fez uma carta e levou o caderno onde estão contidos seus escritos. Mas infelizmente não teve oportunidades de falar com o radialista. Esteve duas vezes, sem sucesso, na estação. A única pessoa que ouviu a favelada foi uma recepcionista que a recomendou as redações dos jornais locais. Aí continuou sua peregrinação e foram publicadas duas pequenas matérias sobre seu livro. Em seguida uma estação de televisão fez um filmete mostrando o seu barraco e falando sobre seu livro. Diz Solange que “agora estou começando a lidar com pessoas humanas, capazes de compreender o meu sofrimento. Eu já fui procurando por um senhor da Editora Lampião, de São Paulo. Espero, com a confiança em Deus, que meu livro seja editado. Com ele quero mostrar as pessoas os meus sofrimentos. Na esperança que alguém olhe por mim e por milhares de pessoas que moram nestes barracos de Alagados”.
“Editando este livro – continuou – espero modificar toda a minha vida e conseguir a educação de meus sete filhos. Nenhum deles está estudando, por falta de fardamento e livros”. Expliquei a Solange que hoje as crianças poderão ir para a escola que lá elas ganhariam fardas e livros com recursos da caixa escolar. Porém mostrou-se desinteressada, talvez já desesperançada com tanta miséria. Em seguida deixou escapar que “uma moça me deu vários cadernos”. Nesses cadernos que foram dados para as crianças ela esta escrevendo seus contos e poemas.
A miséria
O barraco onde reside Solange Ribeiro, seus setes filhos e o companheiro Nelson Santos não mede mais de três metros quadrados. O piso é de tábuas velhas com grandes buracos por onde passeiam ratos e insetos. Nas paredes de tábuas de caixotes estão escritos vários pensamentos de sua autoria. Eis alguns dos pensamentos: “Antes de condenar-me procure absorver teu próprio eu“. Outro diz o seguinte: “O ignorante é o sábio oculto”. Além destes existem outros pensamentos e alguns em francês, língua que aprendeu quando estudou para submeter-se a um concurso público para o cargo de postalista. Ela foi reprovada devido a seu grau de instrução, primário incompleto.
Atualmente nenhum membro da família de Solange está trabalhando. A comida está sendo enviada pelos vizinhos. A luz e água foram cortadas por falta de pagamento. Segundo revelou “depois que fui divulgada caiu um chuvisco sobre nós. O Nelson (seu companheiro) desempregou-se, cortaram a luz e a água. Mas não há de ser nada porque Deus é mais”. E continua: “Atualmente ninguém está trabalhando. Já trabalhei, mas isto foi antes de casar. O primeiro emprego foi na firma construtora Soares Leone como telefonista de PBX. Em 1962, já casada, trabalhei numa empresa técnica em eletricidade, como telefonista. De lá nunca mais trabalhei fora de casa. Talvez por isto minha situação financeira tenha piorado, porque quando meus companheiros se desempregavam a coisa ficava preta”.
Solange atribui que uma das principais razões do seu estado de miséria é devido à sua condição de filha ilegítima. Em vários trechos do livro fala sobre este problema, vejamos: “resolvi escrever este livro porque é parte de minha vida. Nele eu desabafei e conto minha condição de filha adulterina. A caneta e o caderno foram meus maiores amigos nos instantes mais cruciantes de minha vida. A minha presença quase ninguém percebia. Era feia, magra, sem nenhuma aparência física. Fui gerada não sei por quê. Eles não pensaram que no sexo deve haver reciprocidade de afeição. A responsabilidade de um novo ser a encarnar faz-se necessário á preparação. Sinto que ficaram revoltados com a minha presença no mundo. Não sei se lutaram por minha expulsão quando fui feita. A minha jornada evolutiva foi enfrentada com fortes minuanos, borrascas e insucessos, decepções e tudo que pode ferir um ser humano”.
O livro da favelada baiana é recheado de revelações sobre seu estado de miséria, suas decepções e especialmente sobre a condição de uma pessoa marginalizada pela sociedade competitiva. Ela tem plena consciência de sua pobreza, que poderia livra-se com a publicação do livro que escreveu. Basta dizer que é tão grande seu desejo que já bolou até a possível capa. No esboço que fez, Solange apresenta uma mulher sentada com olhar contemplativo, mãos cruzadas e com um vestido longo. No alto desenho uma balança. Num dos pratos escreveu a palavra paz e noutro Fé. A balança está ligeiramente inclinada para o prato onde está escrito paz. Uma paz que ela busca, através de seus escritos, num desabafo de seu sofrimento diário. A Fé, segundo ela, representa a esperança de que as pessoas tomem conhecimento de sua existência e façam alguma coisa por sua família.


MEIO AMBIENTE - MARISQUEIRAS:NA LAMA DO MANGUE, A RAZÃO DE VIVER

A TARDE – TERÇA-FEIRA, 2 DE JANEIRO DE 1979
Texto Reynivaldo Brito
Quando a maré está na vazante e o mangue a descoberto uma multidão de mulheres e crianças corre com latas vazias e outros vasilhames para enfiarem os braços, pernas e rostos na lama podre de onde retiram pequenos mariscos que lhes garantem a sobrevivência. São centenas de marisqueiras que infestam os mangues em todo litoral baiano, especialmente em Salvador, à cata de pequenos mariscos que são vendidos a preços populares nas feiras livres e mercados da cidade. As roupas coloridas e os corpos seminus formam um quadro curioso, principalmente devido ao movimento contínuo de escavar com as próprias mãos a lama à procura dos papa-fumos e ostras. Logo que as águas começam a subir, o mangue vai ficando encoberto e as marisqueiras voltam alegres para seus barracos de onde sairão novamente no dia seguinte para o trabalho. Se está chovendo nada pode ser feito a não ser rezar para que faça tempo bom e possam voltar à lama em busca do sustento de suas famílias.
Esta atividade antes marginal acaba de ser reconhecida pelo governo através um decreto presidencial que regulamentou a profissão das marisqueiras e hoje elas já podem recolher a Previdência Social para gozarem de seus benefícios. Este decreto é fruto de um trabalho que vinha sendo desenvolvido pelas Voluntárias Sociais da Bahia através de sua presidente, D. Maria Amélia Santos (esposa do atual governador da Bahia, Roberto Santos). Depois do decreto, as marisqueiras de todo o país já têm todos os benefícios da Previdência Social, com direito a seguro de acidente do trabalho rural. Caberá, no entanto à Sudepe disciplinar o exercício das atividades dos novos beneficiários fornecendo-lhes as inscrições e os documentos comprobatórios.

                        NOS ALAGADOS
Na enseada de Itapajipe, em Salvador, está localizado o bairro dos Alagados onde residem sobre palafitas mais de 100 mil pessoas, muitas das quais vivem da cata de mariscos que é uma atividade importante, mas tudo indica que dentro de alguns anos essas pessoas terão que procurar outras atividades porque a enseada está altamente poluída por mercúrio e grande parte do mangue está sendo aterrada devido à implantação de um projeto habitacional. Naquele local predominam as pequenas ostras, papa-fumos, lambretas e rala-cocos. Já em outros mangues e baixios localizados no interior do Estado a poluição é quase inexistente e os aterros ainda não são necessários. Aí as marisqueiras ainda trabalham com certa segurança e tranquilidade.
A vida de uma catadora de mariscos é bem simples. Geralmente se deita por volta das 21 horas e acorda quando o sol começa a despontar no horizonte. Arruma nas latas e outros vasilhames, apenas pedaços de pano velhos para cobrir a cabeça e ruma para a lama. A hora de voltar depende da maré. “Quando a maré começa a subir a gente tem que sair, porque com a água alta ninguém pode trabalhar. Os mariscos ficam enterrados na lama e cobertos pela água e é muito difícil captura-los”, afirma D. Ermenegilda Santana, uma senhora negra de mais de 50 anos, que há 22 anos trabalha de marisqueira em Alagados.
Ainda não foi feito um levantamento completo de todas as marisqueiras da Bahia. No entanto, o delegado regional da Sudepe, Edvaldo Severiano dos Santos, acredita que existem centenas delas e cita que alas trabalham em cerca de 150 mil hectares de mangue. Para ele, este tipo de pesca não tem uma infraestrutura. Mas, está sendo implantado na Bahia um projeto bioestatístico, com vistas a controlar a pesca desenvolvida em toda costa baiana na área compreendida entre o Conde e Nazaré das Farinhas, dentre outros locais. Depois, será estendido até Porto Seguro e finalmente a Mouri, no extremo sul do Estado.
                                                                  DISPUTA
Poluído ou não, o marisco é ainda uma fonte de renda e a alimentação principal de centenas de pessoas. Os preços variam de acordo com a clientela, porém, um quilo gira em torno de Cr$ 50,00 e todos os turistas que visitam Salvador provam da “lambreta” que é uma pequena ostra vendida no Mercado Modelo como tira- gosto das batidas feitas com frutas tropicais. Aos sábados o Mercado fica lotado de gente jovem que toca instrumentos e toma as batidas ao som de berimbaus. Ninguém se lembra da poluição da enseada dos Tainheiros ou Itapajipe que mata milhares de mariscos. Também nos restaurantes dos hotéis de luxo e mesmo os localizados em toda orla marítima os mariscos são consumidos em grande escala. Os pratos são deliciosos, especialmente as moquecas que são feitas à base do azeite de dendê. Muitos acreditam que o fogo utilizado para cozinhá-los é necessário para “matar” a poluição.
Porém ,ao lado dos mariscos catados em Salvador e nos mangues do interior do Estado, já se consomem muitos outros importados de Alagoas e alguns estados vizinhos. Isto porque o marisco está se tornando difícil e a procura tem aumentado consideravelmente, especialmente depois da multiplicação dos restaurantes e da presença de turistas na chamada alta estação.
A verdade é que nas praias de Salvador já não se encontram com facilidade as lagostas, ostras, siris, caranguejos e camarões. Grandes quantidades vêm das ilhas que pontilham a Baía de todos os Santos e a maior parte de Alagoas, isto sem falar dos congelados que são comercializados nos supermercados.
O proprietário do restaurante Bargaço em Salvador, Sr. Leonel Evaristo da Rocha, revelou recentemente que usa duas caminhonetes frigoríficas para comprar mariscos em Maceió. “Há sempre uma indo e outra voltando de lá, de modo que dia sim, dia não, recebo siri mole, ostras gigantes, viúvas, lagostas e pitus”. Evidente que os mariscos menores ainda são encontrados em Salvador e que se é comprado fora sai mais caro devido ao transporte rodoviário que é dispendioso.
                                                                          CAMPANHA

Embora não se tenha ainda o número exato de marisqueiras no Estado, os técnicos ligados ao setor de pesca acreditam que existam mais de 10 mil em condições de serem beneficiadas. Para isto está sendo feito um trabalho de conscientização na Ilha de Itaparica, Conceição e outras localidades através da Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social. É a campanha do registro das marisqueiras que lhes garantirá a aposentadoria e assistência médica do INAMPS além da aposentadoria pelo FUNRURAL.


Para dar um caráter de maior segurança ás marisqueiras a Superintendência do Desenvolvimento da Pesca – Sudepe, órgão do Ministério da Agricultura, distinguiu a presidente das Voluntárias Sociais, Sra. Maria Amélia Santos, com o titulo de “Primeira Marisqueira do Estado da Bahia”, também pelos esforços que empreendeu e que resultaram na regulamentação da profissão de marisqueiras, oficialmente reconhecida pelo decreto presidencial n. 81563, de 11 de abril de 1978. Agora, elas estão sendo filiadas às colônias de pesca e têm garantidos todos os benefícios previdenciários.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

CONSUMIDOR - TELEFÔNICAS IMPRESTÁVEIS

OPINIÃO

Reynivaldo Brito

As operadoras de telefones e de tvs a cabo batem recordes de reclamações. Os call centers são verdadeiros caldeirões do inferno. Mulheres e homens com vozes ensaboadas repetem como robôs respostas previsíveis. Quase nada resolvem e, você vai acumulando uma série de protocolos que nada valem.
Enfrentei dois problemas desde o último dia 22 de novembro do ano passado . O primeiro foi a Vivo, que decidiu por conta própria mudar meu plano do celular, que tinha há mais de 15 anos.
Sem qualquer comunicação, este plano pós pago se transformou em pré pago! A empresa não sabe dizer quem solicitou esta mudança. Pode? Isto me causou um prejuizo grande, porque meu celular passou mais de 15 dias só recebendo ligação. Virou um pai-de-santo, só recebia...
Tive que mudar de plano por imposição da operadora. Dei várias queixas a Anatel e nada resolveu. A Anatel virou um cabide de emprego sem qualquer poder de ação em defesa do consumidor.
O outro foi com a Embratel , que com certeza é uma das piores operadoras do país. Vive ai capengando. O telefone fixo de uma das lojas que tenho simplesmente ficou dando sinal de comunicação durante quase 30 dias! Fiz várias reclamações e nada foi resolvido.Decidi pedi a portabilidade para a Oi, esperei mais 10 dias de nada! A solução foi pedir um novo telefone a Oi que em poucos dias instalou , inclusive a internet. Como se pode ver para vender um novo plano elas agem com rapidez.
A Embratel ficou num jogo de empurra dizendo que havia um problema no comercial, depois virou um problema da fibra ótica da empresa que partiu e, em seguida silenciaram.O que adiantou as reclamações para a Anatel. Nada.
Quem vai ressarcir o meu prejuizo?
Aconselharam-me a procurar o Procon e o Juizado de Pequenas Causas .Tentei o Juizado , mas audiência só lá pro final de 2012. Desisti.
E, ainda dizem que somos a sexta economia do mundo. Para sermos um país civilizado falta muito.

domingo, 23 de outubro de 2011

ARTES VISUAIS - FUNDAÇÃO HANSEN NÃO TEM SEDE PARA GUARDAR ACERVO


ARTES VISUAIS
Texto Reynivaldo Brito








  Hansen com sua Ilse em São Felix


Revista Manchete 25 de março de 1970

Há trinta anos, desembarcou em Salvador o gravador alemão Hansen. A terra lhe foi tão agradável que, cinco anos depois, ele se naturalizou brasileiro e adotou o nome Hansen-Bahia. Com sua obra, capaz de captar a mestiçagem e o misticismo da cultura afro-brasileira, vista por um estrangeiro, o artista conquistou fama no país e no exterior, publicando vinte e cinco livros sobre artes plásticas na Europa. Ensinou gravura e expôs suas obras na República Federal da Alemanha e na Etiópia. Mas, nem por isso deixou de voltar para Cachoeira, na Bahia, onde criara, em 1976, a Fundação Hansen-Bahia, para a qual doou três mil matrizes originais de seus livros e os instrumentos de seu trabalho.
Para recolher tal acervo foi escolhido um casarão em Cachoeira, velho de cem anos, e em mau estado de conservação. Para a sua restauração foi escolhido o arquiteto alemão Carl von Hamenschild e logo as complicações começaram. Os técnicos do IPHAN, sob pressão de intelectuais de vários pontos do país , interditaram a reconstrução, alegando que todas as antigas janelas do prédio haviam se transformado em portas. Tentando solucionar o problema, o Governador Roberto Santos, da Bahia, solicitou ao diretor do Patrimônio Artístico e Cultural do Estado, Mário Mendonça , que servisse de intermediário.

AS VERBAS

Segundo Mendonça , informou a Manchete, a futura casa-sede da Fundação Hansen-Bahia, uma antiga fábrica de colchões , “ não tem qualquer valor histórico, apenas está incorporada à paisagem da cidade”. Sua restauração, porém, só poderá ser feita se um problema mais grave for resolvido: o da falta de dinheiro. Até o momento, existe apenas a verba insuficiente, de Cr$400 mil, liberada pelo Ministério da Educação e Cultura, além de promessas de doações feitas pela Fundação Alvares Penteado, de São Paulo, e de prefeitos da Região Metropolitana de Salvador, tais como os de Camaçari, São Francisco do Conde e, evidentemente, Cachoeira. Enquanto isso, Hansen-Bahia, convalescendo de recente operação, espera numa fazenda nos arredores de Cachoeira um abrigo para a sua doação.




SAUDADES DE  HANSEN

Foi a última vez que encontrei Hansen e Ilse em sua casa na cidade de São Félix. Ele estava muito doente e construía uma piscina em sua casa, a qual não chegou a concluir. Falava do futuro e tinha fé que sairia daquela situação em que se encontrava. Não saiu. Para tristeza de todos que gostavam deste alemão que adotou a Bahia como seu sobrenome. Ficou a saudade. Muita saudade de seu jeito, que a princípio parecia grosseiro mas, que sabia cativar as pessoas. Tenho alguns trabalhos de Hansen, e cada vez que olho para eles lembro de seu jeito simples e quase rude. Lembro de suas risadas altas e seu pavio curto, que explodia com certa facilidade.Este foi o Hansen que conheci.Um dos grandes gravadores que já apareceram por aqui.
Ele soube captar , a exemplo de Carybé, este jeito baiano do povo simples do Mercado de São Miguel,da Feira de São Joaquim,da rampa do Mercado Modelo.
Mirou as prostitutas e os malandros tão presentesna obra do grande escritor
Jorge Amado, um injustiçado por não ter sido laureado com o Prêmio Nobel de Literatura.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

MEIO AMBIENTE - O HORRÍVEL SOM DA PREFEITURA

OPINIÃO
Reynivaldo Brito

Telefonei para o 2201-6660 ,hoje, dia 12, por volta das 19 horas, com o objetivo de reclamar da poluição sonora que vinha do início da rua Valle Cabral, na Pituba. Alguém que não tem qualquer noção de cidadania resolveu fazer um show de axé em plena via pública incomodando toda a vizinhança.
Para minha surpresa fui obrigado a ouvir por quase 5 minutos um som do mesmo nível e de altura quase idêntica ao que me propunha a reclamar.Por dezenas de vezes ouvi "Sua ligação é muito importante. Dentro de instantes vamos atende-lo."Cansei de tanto ouvir esta mensagem chata, além de outra de propaganda da Prefeitura com uma letra pobre em rítmo de pagode.
Aliás, por falar em propaganda, nunca tinha ouvido e assistido tanta propaganda da Prefeitura e do Governo do Estado como está acontecendo agora. Tenho informações que as televisões tsambém nunca faturaram tanto do município e do estado como nas atuais administrações. Com a palavra o Ministério Público e os tribunais de contas do município e do estado.
Voltando ao som que tentei reclamar, terminei por desistir e, isto deve estar ocorrendo com muitos cidadãos desta Cidade que tentaram ou tentam reclamar da poluição sonora . Simplesmente, posso dar este depoimento que se funciona, tem um péssimo atendimento.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

RELIGIÃO - MONGES BENEDITINOS - O TRABALHO E AS IDÉIAS

A TARDE – DOMINGO, 3 DE SETEMBRO DE 1978
Texto Reynivaldo Brito


Uma das personalidades do clero em Salvador mais conhecidas era d. Jerônimo de Sá Cavalcante, ( foto) já falecido, um cearense natural de Fortaleza que dividiu sua vida sacerdotal entre a Bahia e Pernambuco, onde deu os primeiros passos para a fundação da atual Faculdade de Filosofia daquele estado. Ordenou-se na Alemanha, em Beuron ,em 1939.No ano de 1942 retornou ao Brasil, sendo designado para servir na cidade de Garanhuns, interior de Pernambuco, vindo depois para Salvador. Foi durante dez anos o prior do mosteiro e renunciou em abril de 1975 depois de uma entrevista dada a um jornal local sobre o divórcio, tema proibido naquela época a debate público por sacerdotes. Mas, o monge não mudou e suas idéias continuaram sendo defendidas visando à defesa e promoção da pessoa humana.
Dizia d. Jerônimo que sua preocupação era de estar presente não apenas nos momentos de angústia da comunidade, mas, também, nos momentos de alegria. Pouco antes de ser monge estava estudando muito a Teologia para sentir e encontrar a doutrina do povo. "Quando falamos em cristianismo lembramos o Cristo que no século IV foi descoberto pelos homens como sendo o Deus. Hoje estou estudando esta problemática que considero difícil e da mais alta importância para nós. Sei que é uma problemática difícil de ser entendida por alguns. Enquanto a igreja se apresenta no plano social, é claro que, todos entendem e aceitam, quando tratamos de Deus surgem as dúvidas para as quais temos e também buscamos respostas. E, o Cristo que trouxe a sua mensagem. Por isto não estou preocupado em fazer, mas estou preocupado em ser. Reflito sobre a Teologia da Libertação e chego até aos miseráveis que habitam este Nordeste e mesmo os Alagados, que é uma comunidade com mais de 100 mil almas, vivendo uma vida sub-humana sob todos os aspectos. Compreendo que o desequilíbrio dessas regiões ou locais em relação a outras desenvolvidas não é porque Deus quer e, sim, porque os homens vivem distorcendo as coisas e só pensam na riqueza” – Dizia d. Jerônimo numa entrevista que fiz para a revista Manchete.
Confessou que existem posições contraditórias dentro do próprio mosteiro e foi mais além “dentro da própria ordem”. “Mas isto – adiantou – demonstra a nossa independência. Basta dizer que os mosteiros são independentes. Tem governo próprio através do abade e do prior. Acho a discórdia muito válida e é bom salientar que na base estamos irmanados no mesmo pensamento em busca do Cristo que dá resposta aos nossos problemas”.
Continuava afirmando que "o matrimonio é uma comunidade de amor. Para isto o cristianismo deveria ter uma preocupação constante com a essencialidade do matrimonio que é o amor. Não existindo amor não sou favorável que as pessoas continuem juntas. E, vou mais além. Quando estudo a questão da reprodução humana vejo o problema do ponto de vista teológico que o casal tem essencialmente o direito de ter um filho que quer e quando quiser. É um direito do homem, inerente a ele de exercer a sua função reprodutiva em plena liberdade e sem constrangimento, seja ele qual for, procurando descobrir aquelas normas que dirige e governa no mundo. O filho não é fruto do fatalismo ou da simples Providência Divina. O filho é resultado exclusivo da vontade de duas pessoas: um homem e uma mulher. Eles é que decidem a geração de um ser. É um ato altamente humano onde participa a liberdade plena do casal. Sei que alguns ainda vêm o casamento no cristianismo o encontro sexual do homem e da mulher como primordialmente reprodutivo, quando na realidade deve ser unitário, o que pode ser comprovado pela Teologia e a própria Ciência."
Falando sobre seu contato com a Juventude quando participava e orientava os integrantes da Juventude Universitária Católica – JUC declarou d. Jerônimo que sentia e compreendia a revolta do jovem. “O meu contato atual com os jovens permite que tenha uma idéia que o jovem demonstra uma rejeição ao cristianismo hoje apresentado. Isto porque o jovem não encontra este cristianismo respostas para seus anseios e nós que os lideramos do ponto de vista espiritual precisamos ter muito cuidado na apresentação da doutrina de Cristo. É preciso entender e falar a linguagem do jovem para ser aceito e influir em seu comportamento."
E continuou " Não apenas os jovens rejeitam o cristianismo hoje em dia. Isto porque o cristianismo que muitos apresentam é puramente europeu fora de nossa realidade. É bom para nós brancos, descendentes de europeus, mas não para o índio ou o negro. E dentro deste ponto de vista que ora desenvolvo meus estudos para entender a doutrina própria da comunidade em que gravito”.
Além de estudar d. Jerônimo tinha várias atividades fora do mosteiro entre as quais era membro da Associação de Dirigentes Cristãos de Empresas (fundador) e trabalhava no Inocoop, órgão encarregado de orientar e traçar a politica das cooperativas habitacionais. Visitava fábricas e mesmo conjuntos habitacionais já construídos para saber das necessidades dos adquirentes. Sua luta no Inocoop era pela construção de unidades habitacionais dignos e de fácil aquisição. Era ainda conselheiro de vários casais que enfrentam problemas matrimoniais.
Finalizando sua entrevista d. Jerônimo de Sá Cavalcante, um monge de idéias consideradas progressistas fez questão de afirmar que tinha muita fé em Cristo e acreditava que tudo começa do homem para Deus. Esperava ter ainda saúde para continuar ajudando a todos aquelas que precisam e a entender os problemas sempre renovados da juventude.

                                                                   ARTISTA
Já o irmão Paulo Lachenmayer chegou à Bahia em 1922 com mais três colegas: José Endres Lohr, atual arquivista e historiador, Conrado Metzger, já falecido e d. Clemente da Silva Nigra, que dirigiu o Museu de Arte Sacra da Bahia por um longo período. Por serem alemães sofreram muito durante a II Guerra Mundial, o que é relembrado com tristeza pelo irmão Paulo um artista nato que estudou com grandes mestres em sua terra natal a escultura e arquitetura interior de templos. Ele faz questão de afirmar que “não sou decorador. Sou um arquiteto especializado em interiores sacros. Não trabalho com arte profana. Sei que muitos arquitetos fazem trabalhos em interiores de templos, mas na realidade não conhecem o assunto e fazem coisas realmente condenáveis. Ele foi consultado sobre a ambientação dos interiores das catedrais de Brasília e Rio de Janeiro, sendo que nesta última ficou muito aborrecido com umas determinações tomadas pelos responsáveis pela construção da igreja e terminou arrumando suas malas e retornando a Salvador, depois de dois anos orientando os trabalhos. Diz irmão Paulo que o grande problema é a incompreensão de algumas pessoas que não concordam com a necessidade da união da funcionalidade dos objetos com o próprio ambiente sacro dos templos”.
Na qualidade de escultor o irmão Paulo fez um grande Cristo crucificado completamente diferente dos que estamos acostumados a ver. O seu Cristo fundido em bronze e depois reproduzido em escala industrial sereno e não está retorcido na cruz. Parece aceitar os castigos impostos pelos soldados romanos com certa serenidade.
Conta irmão Paulo que fez ainda uma Santa Terezinha, bem moderna, e o então cardeal d. Augusto Alvares da Silva, já falecido, mandou retirar as duas imagens porque não representavam o Cristo e a santa. Isto foi um grande golpe e de lá para cá nunca mais esculpiu. Com isto belas e modernas imagens deixaram de ser esculpidas voltando-se para criar brazões para irmandades, prefeituras e igrejas. Um trabalho que o tornou conhecido não apenas no Brasil, mas em vários países. E hoje um estudioso da Heráldica. Para ele a Heráldica não tem aprendizado, tudo depende da convivência. Pelos livros ninguém aprende Heráldica. É preciso sentir e entrar na alma desta arte.


                                                                  RECOLHIDO

O monge d. José Lohr Endres vive praticamente recolhido. Quase não participa das reuniões e orações feitas em conjunto. Sua vida está ligada às pesquisas que desenvolve sobre a ordem no Brasil e no exterior. Publicou em 1975 um extenso trabalho intitulado “Catalogo dos bispos gerais, provinciais, abades e mais cargos da Ordem de São Bento do Brasil” de 1582 a 1975 onde traz informações detalhadas sobre mais de 500 religiosos. Um trabalho paciente e considera de grande importância para o estudo da ordem beneditina.Atualmente, encontra-se no prelo um livro de quase 300 páginas. “O ordem de São Bento no Brasil”, que deverá se lançado dentro em breve. Além destes d. José está escrevendo e revendo outros trabalhos já concluídos.
É responsável pelo arquivo do mosteiro e mantém sob sua guarda importantes documentos. Muitos historiadores o procuram para consultas sobre assuntos ligados a História da Bahia, da qual a ordem tem uma participação considerável.
O monge d. Mariano Costa Rego é o responsável pelo setor de serviço social, fundado por ele há três anos, que já conta com mais de dois mil atendimentos. Foi nomeado pela Arquidiocese de Salvador como coordenador da Comissão de Ecumenismo. Disse que “por enquanto estamos mantendo contatos com religiões cristãs. Mas, devido à própria formação religiosa baiana teremos que expandir nossos contatos com outras religiões e seitas”. Ensina ainda duas cadeiras na Faculdade de Filosofia da Universidade Católica do Salvador e receber incumbências e solicitações do bispo que “assumo com grande alegria“.
Falando sobre seu trabalho a frente do Serviço Social do mosteiro de São Bento da Bahia diz d. Mariano que “temos duas faixas de atendimento. Para os nossos funcionários e para o pessoal que nos procuram. O atendimento aos funcionários é mais efetivo, pois procuramos acompanhá-los em seus desejos e necessidades”.
Tem uma idéia bastante interessante sobre o celibato. Diz que o celibato é uma escolha positiva da descoberta de um amor maior, que é plenamente capaz de catalizar todas as forças a serviços de Deus. Isto é enquanto um homem casa e ama uma mulher, nós amamos a todos.

                                                                                     REALIZADA


A prioresa do novo mosteiro das monjas beneditinas em Salvador Joana Calmon Villas Boas disse que “estamos aqui para um grande trabalho de promoção humana que esperamos contar com a ajuda dos baianos. Há 20 anos que estou na ordem, depois de ter sido professora com curso de mestrado no Canadá e outros países da Escola de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia. Entrei para o mosteiro um pouco tarde não porque a vocação chegou depois. Mas porque tive que orientar a criação de meus irmãos devido ao falecimento de minha mãe. Isto foi bom porque conheci a vida exterior. A vida religiosa foi para mim uma imensa riqueza que Deus me deu. Sou plenamente feliz como pessoa, como era antes de entrar pra o convento, pois era uma profissional respeitada e venho de uma família de certos recursos. O que desejo agora é trabalhar com minhas colegas. Vamos ter uma vida contemplativa refletindo com as pessoas que vão nos procurar, com os jovens e casais. Pretendemos desenvolver um Serviço Social tendo uma vista a promoção humana”.
Junto com a prioresa veio à monja Vera Lúcia Parreira Horta, carioca, que estava no mosteiro de Belo Horizonte há 10 anos. Moraram alguns anos em Salvador onde frequentava a Escola de Teatro e Dança como qualquer universitária. Chegou a estudar dança. Abandonou tudo e abraçou a vida religiosa. Ela é uma das principais pelas orações que são contadas, feitas pelas monjas.

                                                     VIDAS DOS HOMENS

O abade d. Timóteo Amoroso Anastácio, do Mosteiro de São Bento da Bahia afirma que o que caracteriza a vocação monástica é a busca de Deus. O monaquismo (e a vida religiosa em geral) só se define por este objetivo: buscar a Deus. Por isto, quaisquer que sejam as suas atividades pessoas e comunitárias, a vida do monge é toda orientada para esta finalidade. “Mas esta busca se faz numa comunidade de irmãos que descobriram em si idêntico apelo se consagram a isto, através da oração particular e comum, do trabalho, do serviço dos homens”.
– É interessante notar que a verdadeira busca de Deus jamais se realizou, no monaquismo beneditino, à custa do desapreço pela vida dos homens, pela história dos homens. Em toda parte onde floresceu este tipo de vida, processou-se naturalmente uma admirável harmonia entre o culto e a cultura, isto é, a busca de Deus e a solidariedade com os valores humanos autênticos. Deste modo, os monges beneditinos nunca podem alienar-se das aspirações mais genuínas dos homens, especialmente do grito mais ou menos conscientes que sobe da consciência humana por liberdade, justiça, solidariedade e paz.
D. Timóteo adianta que “unidos em sua vida o ideal do lema “ora et labora”, os monges tentam juntar e harmonizar as três dimensões essenciais do homem em geral: a adoração de Deus, o trabalho de construção da historia humana e a fraternidade universal. Nem sempre, ao longo da história beneditina de quase 1.500 anos, temos sido plenamente fiéis a esse tríplice sentido da nossa vida. Mas esse ideal está sempre chamando o monge. Ele crê na nitidez deste lema nos tempos atuais.
São Bento foi isto: no mundo Caótico e violento ele instalou aquelas ilhas de paz, de oração, de trabalho, de fraternidade que influíram decisivamente para a transformação da sociedade, e na defesa dos valores humanos ameaçados de extinção. Este é o exemplo que Bento nos deixou. Não pretendemos intervir no mundo, mas acreditamos na força secreta e na eficácia misteriosa dos valores de paz e de beleza, que nos inspiram”.

                                                                PARTICIPAÇÃO

Com a fundação do mosteiro de São Bento da Bahia e em outros estados os beneditinos começam a estender sua influência, não só no campo religioso como no econômico e cultural. Dentro dos mosteiros encontramos monges desenvolvendo atividades de grande relevância para as comunidades que o circundam. Os monges não ficam apenas preocupados com a vida contemplativa. Eles têm atividades dentro e fora dos mosteiros que são importantes. Nas artes lembramos de frei Agostinhos da Piedade, da Bahia , que fez muita imagens em terracota, consideração o mais importante ceremista do século XVII, o frei Ricardo do Pilar, um grande pintor; frei Domingos da Conceição e Silva, escultor e frei Agostinho de Jesus responsável pelos trabalhos em cerâmica do extintor mosteiro de Parnaíba, em São Paulo. Estes são alguns poucos dos nomes que sobressaíram através da história dos beneditinos no Brasil. Dezenas de outros nomes poderiam ser aqui citadas. Isto porque a criação é uma constante dentro dos mosteiros onde vivem pesquisando, estudando e trabalhando homens de grande talento.

RELIGIÃO - MONGES BENEDITINOS:QUATRO SÉCULOS DE VANGUARDA RELIGIOSA

A Tarde - domingo , 27 de agosto de1978
Texto Reynivaldo Brito


Há quatro séculos chegaram a Salvador, na Bahia, os primeiros monges beneditinos com o objetivo de fundar um mosteiro desta importante ordem religiosa em terras do Novo Mundo. Foram recebidos com euforia pela população. Meses depois iniciavam a construção de mosteiros, que desde aquela época são uma presença marcante na vida religiosa ,econômica e cultural do Estado. Defensores do lema “Ora e trabalha” os monges beneditinos harmonizaram três dimensões essenciais do homem: a adoração a Deus, o trabalho de construção da história humana e a fraternidade universal. Um lema que tem acompanhado os membros da ordem durante os séculos. Suas idéias e projetos nem sempre receberam ou recebem a aprovação de determinados setores da sociedade brasileira. Mas, a desaprovação nunca esmorece um monge beneditino, que deseja uma participação maior junto à comunidade que serve. Foram eles os responsáveis pela implantação dos Cursos Jurídicos e de Agronomia no país e são ferrenhos defensores das liberdades individuais.
 Na foto ao lado a arquitetura majestosa da igreja de São Bento
Desde o ano passado que os mosteiros beneditinos estão em festa comemorando ainda dois importantes acontecimentos ligados à vida da ordem: O Sesquicentenário da criação da Ordem Beneditina Brasileira, que foi separada da Ordem Beneditina de Portugal através da Bula Inter Gravíssimas Curas, do papa Leão XII, datada de 1 de julho de 1827, e a chegada do Brasil dos monges alemães e belgas da congregação de Beuron, que vieram repovoar os mosteiros que estavam enfrentando sérias dificuldades em fins do século passado devido a uma grande crise vocacional. Estas comemorações antecedem uma grande festa que ocorrerá em 1981 quando o mosteiro de São Bento da Bahia completará 400 anos de fundado. As idéias progressistas dos monges beneditinos estão presentes em vários momentos da História do Brasil. Quatro mil escravos foram libertados 17 anos antes da Lei Áurea, ou seja, em 1871 quando houve a libertação geral livrando-se a ordem de uma mancha de muitos anos.
Durante a invasão holandesa os monges foram defensores das terras do Brasil organizando e apoiando focos de combates. Em 1630 os holandeses praticamente destruíram os mosteiros da Bahia e Olinda e os monges se refugiaram em fazendas no interior. Depois de duas décadas voltaram e reconstruíram seus mosteiros, que tantos serviços religiosos e culturais emprestam ao país.
Explica o historiador do Mosteiro de São Bento, d. José Lohr Endres que as igrejas e os mosteiros foram planejados por arquitetos da ordem e na Bahia se destaca o Museu de Arte Sacra, o convento dos Teresios, a igreja da Misericórdia, a Prefeitura e, provavelmente, o antigo palácio do Governo. O próprio mosteiro de São Bento da Bahia é um dos exemplares mais bem conservados da arquitetura beneditina. Embora tenha sido reformulado várias vezes.
Em 1624 os holandeses ocuparam o mosteiro e em 30 de março de 1625 foi transformado em Quartel General do Sul. Aos 2 de abril de 1625 os holandeses, num ataque inesperado, mataram grande parte da guarnição que hoje está sepultada no seu claustro. A destruição ocorre nesta época, deixando de pé alguns muros. A reconstrução durou muito tempo e em 1750 os trabalhos foram paralisados devido à perseguição movida pelo Marquês de Pombal às congregações monásticas. Um século depois o abade d. Arsênio da Natividade retomou a reconstrução do mosteiro.

                                                                EXPANSÃO
Partindo da Bahia os beneditinos procuraram expandir suas idéias e entre os anos de 1582 a 1586 (existe dúvida quanto à data exata) fundaram o mosteiro de Olinda. Seguiram-se os mosteiros do Rio de Janeiro em 1593, e o de São Paulo em 1610. Novas fundações ocorreram durante o século XVII, entre os quais o da Paraíba, no Recôncavo Baiano, em Parnaíba e Santos, ambos no estado de São Paulo.
O crescimento do número de monges e mosteiros possibilitou uma presença maior na vida da comunidade quer no campo religioso como no campo econômico por meio de seus engenhos e grandes fazendas. Em Olinda eles cultivaram em grande escala a cana-de-açúcar e no Rio de Janeiro a pecuária que alimentavam muitos habitantes da cidade naquela época. São conhecidos a Grande Fazenda de Campos e o Engenho de São Bento de Iguaçu, que faziam parte do mosteiro do Rio de Janeiro.
Foi no mosteiro de Olinda o berço do primeiro curso jurídico do Brasil, ao lado do curso iniciado em São Paulo. Logo depois a perseguição movida pela maçonaria e pelo Marquês de Pombal resultaram em sérias dificuldades para os monges que já não contavam com a ajuda dos governantes que proibiram o reconhecimento dos cursos realizados por alguns noviços que foram enviados para Europa com o objetivo de evitar o esvaziamento dos mosteiros. Somente em 1890, já na República é que o monge Domingos da Transfiguração Machado reiniciou o repovoamento dos mosteiros.
Contam os historiadores que na época da realização do primeiro congresso dos Abades Beneditinos, em Roma, em 1893 o Papa Leão XIII pediu a congregação Beneditina de Beuron, Alemanha, que se incumbisse da missão de restaurar a ordem no Brasil. Finalmente foi encarregado o mosteiro de Maredsous, na Bélgica, pertencente aos alemães que enviou alguns monges chefiados por d. Gerardo Van Caloen, que desembarcou em Recife no dia 17 de agosto de 1895. Os 16 monges e d. Gerardo foram recebidos pelo único colega existente em Olinda, d. José de Santa Julia Botelho e o abade-geral, d. Domingos da Transfiguração Machado. Foram depois para a Bahia e São Paulo. Porém, no Rio de Janeiro foram repelidos pelo abade d. João das Mercês Ramos, o qual não aceitava os belgas e insuflou os fiéis contra os novos sacerdotes. A população invadia o mosteiro e os monges conseguiram fugir com ajuda de um velho ex-escravo até que foram garantidos pela polícia e o trabalho prosseguiu.

                                           HOJE ESTÁ CRESCENDO


Enfrentando momentos difíceis através dos tempos os beneditinos são atualmente muito procurados por jovens que desejam abraçar a vida religiosa. Segundo declarações recentes do abade-presidente da Congregação Beneditina Brasileira, d. Basilio Penido “nunca nos últimos 50 anos, tivemos tanta procura; hoje, a ordem tem 30 noviços e postulantes. Isso é bom sinal, pois antes, há uns 10 anos os jovens nos procuravam com o aspecto social ou político, mas hoje, a maioria vem por causa da oração. Não que sejam campos antagônicos, e, sim, complementares. São os mesmos jovens que ora se aprofundam nessa ou naquela direção. E, estamos sempre prontos para acolher todos para reza conosco”.
Na foto ao alto os monges beneditinos baianos ouvem a palavra do abade D. Timóteo Amoroso.

No ano passado dois jovens baianos entraram para o noviciado no mosteiro de São Bento da Bahia, são eles: Carlos Francisco Linhares e Moacir de Azevedo Rabelo Leite, ambos com 20 anos de idade. Estavam há dois anos na qualidade de postulantes ao noviciado. Eles participavam dos movimentos de jovens do mosteiro e segundo declararam a vontade abraçarem a vida monástica veio aos poucos.
Embora a ordem tenha uma atuação marcante na Bahia, somente agora está sendo implantado um mosteiro dedicado as monjas beneditinas. Dois terrenos já foram oferecidos por pessoas ligadas ao clero, sendo um localizado nos arredores da cidade e outro no município de São Francisco do Conde, que dista cerca de 60 quilômetros de Salvador. Oficialmente o mosteiro já foi criado e as monjas que vieram sob a orientação da prioresa Joana Calmon Vilas Boas estão alojadas provisoriamente nas dependências do mosteiro das irmãs Carmelitas, no bairro de Brotas. Elas já foram abençoadas pelo cardeal e Primaz do Brasil d. Avelar Brandão Vilela, durante uma cerimônia realizada na capela do referido mosteiro.
Conta à prioresa Joana Villas Boas que somente em 1910 é que surgiu o primeiro mosteiro para moças interessadas em ingressar na vida religiosa beneditina. A primeira monja foi Gertrudes da Silva Prado que por não existir templos femininos no Brasil, teve que se deslocar de São Paulo para Stambrook, na localidade de Calow End, na Inglaterra, onde fez o noviciado. Mais tarde, ao lado outras moças fundou o mosteiro de Santa Maria, em São Paulo vindo a ser a primeira abadessa da ordem no Brasil. Este mosteiro possibilitou a fundação de outros a saber: em Buenos Aires, Montevidéu, Juiz de Fora e Belo Horizonte. Neste último residem 45 monjas, cinco das quais vieram fundar o mosteiro na Bahia. Além desses ainda existem mosteiros em Olinda e Caxambu.
Explica a monja que pretende além da vida de orações, incrementar os trabalhos de promoção humana e receberão hóspedes que queiram participar das orações.

                                                   PARTICIPAÇÃO

As atividades dos beneditinos vêm sendo ampliada. Na Bahia eles possuem o Ginásio São Bento, a Tipografia e Editora Beneditina, o Coral da Juventude, um Serviço Social com dois campos de ação – um em função dos funcionários da ordem quebrando o relacionamento tradicional entre o padrão e o empregado, e outro, destinado aos pobres que procuram os monges. Além de manterem contatos permanentes em vários setores da sociedade com empresários, jovens e operários. Um trabalho abrangente de um grupo de homens dedicados a servir aos semelhantes.
A ordem criada em 543 por São Bento, um estudante de Direito, nascido em Múscia, na Itália conta atualmente na Bahia com 11 monges e seis irmãos. O abade é d. Timóteo Amoroso Anastácio é o prior d. Noberto Santana responsável pela direção do Ginásio São Bento e pela administração do mosteiro.